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"Esse rio é minha rua..."

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  Fotografia de Lorena Rodrigues, Belém, 2018.

Ao meio-dia

Traga o sol. Traga o sol para mais perto. Traga-o. Solamente una coisa te pido: Solidifique os laços com a luz. Solte o trago que te insola. Pasme diante do solar Da beira à eira. Sem plasma tv. Seja o sol. Sol a sol. Sol na sola. Traga o sol. Traga o sol para o teto. Traga-o. Sole um solilóquio. Ensaia a letra inteira Na barra da tua saia. Toda a plateia Está a tua espera, Grata ao sol. Traga o solo Que te pariu. Solte a mente. Tragando o vil Astro das manhãs. Rei serás da tua soul. Ação insólita pensar Que mesmo após os poentes, O sol se torna poema. "Sou o que sol" É o cantar dos consolidados. "Sol, o que eu sou?" A pergunta dos desolados. No cósmico viver, Tragando o sol, A ordem é uma só: Seja um feto, em teu ventre, o sol. Afete o que te fere. Fiat lux. Lorena Barreto

Chrônica de ninar

  Do alto da inércia que me paira, assisto sentada ao deslizar de meu corpo sobre a lâmina brilhante de um punhal. Insistente sou em vagar nas horas tardas. Sinto trêmulos ponteiros a fragmentar as linhas certamente finitas de minha ímpar existência. Divagando observo aos furtos que o destino lança contra a tênue linha que me tece. E assim, a cada dia, encontro minúsculas elipses que tramam minha composição. Um dia serão tantas que me tornarão opaca. Esse processo de desmanche já me é dado a conhecer desde tenra idade, pois que vejo o chronos a devorar-me, mesmo antes de dar meus primeiros passos. Porém, engano do voraz que pensa findar minha essência na matéria. Não sabe ele que sou imortal. Lorena Barreto (29/04/2014)

Mistério de morte

Há muito esqueci quem eu sou Hoje sou o que era Ontem eu era alguém inexistente O que sou estava escondido Ah, como eu queria ser realmente Aquele ser inexistente Que hoje vai aos poucos esmaecendo. Lorena Barreto Escrito em 2010

Missiva do Céu

Observe os leves passos sobre a grama Acompanhados do frenético pulsar de um coração Tomado por sonhos E cheio de fôlego. Quem vê tal criatura se pergunta Como pode um ser tão forte Ser tão delicado como um diamante? Bruto brilho que reflete o sorriso cortante. Olhar denso que pede para ser decifrado Linhas ternas de uma face aveludada. Mãos que tecem seus próprios segredos E os guarda em seus mais profundos anseios Oh, da tua força jovial cantes a doçura. Terrena existência cheia de graça, te escondes atrás de rija postura, mas teus olhos não disfarçam. Eles revelam tua essência. Com tal incandescência cativas os que em ti fixam o olhar, mudos muitos ficam, sem saber o que falar. Mas graças à existência dos poemas que permitem expressar o indizível que só os artífices das palavras podem contar. Lorena Barreto 06/04/2014

Morrer é preciso!

Ostras, habitats naturais daqueles que escondem as palavras, dos que guardam a alma, dos que se perdem em silêncio. Retirar o mistério que as habita torna-se morte, dor que revela a luz mais viva, mais terna do que o sol. Nascimento do que existia sem ser. Lorena Barreto